domingo, 30 de novembro de 2008

ZECA: O Homem-bomba
Por Ivandro Coelho

Cheguei em casa hoje muito cansado. Mas ainda deu tempo de assistir o programa do Jô Soares - sim, leitor, eu assisto o Jô. Por que não? E sabe quem estava lá? Zeca Baleiro, divulgando o novo CD: “O coração do homem-bomba”.

Zeca abriu o programa cantando um dos sucessos do disco, cujo refrão é mais ou menos assim: “Você não liga pra mim, mas eu ligo. Você nunca fica só, o celular é o seu melhor amigo”. Ele estava acompanhado da banda, que agora conta com uma novidade: os metais. Ficou ótimo.

O maranhense continua eclético. Experimentalista. Passeia com facilidade por ritmos diferentes como o samba, o ska e o rock. Mas o barato do disco é a canção “Toca Raul”, que ele fez em homenagem ao eterno maluco beleza do rock brasileiro: Raul Seixas.

Ao ver Baleiro cantando ontem, lembrei do tempo em que o conheci. Na época, tinha acabado de chegar do interior. Fui para São Luís estudar e, como diria Raulzito, ainda era “inocente, puro e besta”. Mas como sabia tocar violão, logo fiz amizade com Josias Sobrinho - cantor e compositor maranhense dos bons. E ainda por cima amigo de Zeca.

Josias se tornou uma espécie de meu guru musical. Era ele quem me apresentava a outros artistas, levava para shows e me metia em rodas de poetas e intelectuais da Ilha. E foi assim que acabei arranjando um contrato num bar alternativo chamado “Chaplin”, no bairro da Cohama.

Lá era o point de boêmios, universitários, malucos, intelectuais e alguns porras-loucas. Eu tocava na terça, Zeca na quinta e Josias Sobrinho na sexta, que era o melhor dia. Josias era a estrela, por isso tinha esse privilégio.

Lembro-me como se fosse hoje: Zeca cantando naquele barzinho, voz e violão, acompanhado apenas de uma caixinha amplificada. No entanto, mesmo naquela época, Baleiro já trazia consigo o germe do grande artista em que se transformaria alguns anos depois. Por isso só tocava suas próprias músicas.

Foi lá que ouvi pela primeira vez os versos de “A flor da pele”, canção imortalizada na voz de Gal Costa (ouça logo abaixo). O “Chaplin” era um bar minúsculo e dava pouca gente dia de quinta. Mas Zeca nem ligava para isso. O importante era mostrar o trabalho. Já era, portanto, um artista profisional.

Agora o vejo de novo na TV, mostrando mais um trabalho em dois volumes. Fico feliz com isso. Espero que o coração do homem-bomba Zeca Baleiro continue explodindo e que seus estilhaços poéticos atinjam cada vez mais pessoas de diferentes lugares. Quem sabe assim a gente se sinta “menos pó, menos pozinho” nesse "mundo cão".

Segunda-feira, 17 de Novembro de 2008
CEUMARAVIA, CEUMARAVIÁ!*
(anotações sobre o show de Ceumar, sexta-feira, 14, no Espaço Armazém, por Zema Ribeiro)

O trânsito não estava fácil. Trânsito caótico é dessas coisas ruins de cidade grande que São Luís já tem. Forquilha. Um estúdio e uma cópia do disco de Gildomar Marinho. A estréia que está sendo gravada. Olho de Boi, finalmente, moçada!

Baixei as faixas num computador e me mandei pro Espaço Armazém. Havia marcado com Ceumar na passagem de som. Na porta, encontro Gilberto Mineiro. Lá dentro já estava Luiz Cláudio, o percussionista do Choro Pungado que tocou em Dindinha, a estréia da mineira.

Ceumar reconheceu-me, eu completamente diferente da última vez em que nos vimos. Eu havia ido armado com minha péssimáquina fotográfica. Deixei-a quieta num dos bolsos da mochila. A mineira ganhou um pandeirão do percussionista e já convidou-lhe para tocar, na apresentação de logo mais à noite. Sem ensaio. Tomei a liberdade de sugerir que fizessem um número, os três juntos, eles dois e Josias Sobrinho, anunciado como convidado especial da noite, compositor de quem Ceumar gravou duas músicas em sua estréia.

Ela pediu-me desculpas: o cd de Gero Camilo (sim, o ator!) – compositor também gravado pela moça de Itanhandu – que eu havia pedido para ela trazer-me, havia ficado. “Mando depois por correio”. Sem problemas. “Ah!, depois tu vai fazer uma lista dos discos que tu quer que eu te mande”, ela provocou. “Sim, vamos nos falando”.

Passei-lhe a cópia da gravação de Gildomar, explicando que ainda estava tudo cru, mas que era para ela ter uma idéia do que seria: “queremos que você participe da sétima faixa dessa gravação, uma música chamada Ladainha da remissão”. Ainda conversamos um pouco, até descermos, eu e Luiz Cláudio, já conversando sobre o show – Loopcínico – que ele apresentará no encerramento da II Semana de Música do Maranhão (domingo, 23, Largo da Madre Deus, depois digo mais). Saí sem pedir duas coisas (mais) a Ceumar: para fazer uma fotografia com ela e que ela tocasse a Oração do anjo (parceria dela com Mathilda Kóvak) no show de logo mais. Da foto, receei recusa, era antes do show, sabem como é mulher, né? A canção, sei lá... Temi ficar sem mel nem cabaça, como se dizia antigamente, já que minha noiva é avessa a tietagens, autógrafos e similares.

Uma volta pela Praia Grande antes do show começar. Eu com dois pares de ingressos: os nossos e o de um casal amigo. O produtor havia recomendado que chegássemos cedo: o espaço era pequeno e certamente alguém iria assistir ao show em pé. Não fomos nós: conseguimos uma mesa, e enquanto o show não começava, conversávamos assuntos diversos, por vezes a conversa dos homens atravessando a conversa das mulheres e vice-versa.

Vez por outra me levantava para cumprimentar conhecidos – passei cópia de gravações do Choro Pungado para Luiz Cláudio entregar a Ceumar – e, reconhecendo o garçom, de outro bar, agora trampando ali, já dei um jeito de não ter que levantar para pegar fichas durante o show.

Não demorou muito para que Mário Jorge, o produtor local, subisse ao palco e anunciasse o projeto Armazém Acústico, cujo primeiro show seria aquele de Ceumar. A idéia é fazer uma série de shows com bons artistas, em geral não holofoteados pela grande mídia. Boa!

Ceumar subiu ao palco e falou da eterna confusão: gente até hoje pensando que ela é maranhense por conta da produção de seu primeiro disco, de Zeca Baleiro, e das gravações dela para músicas do produtor e do maranhense Josias Sobrinho. “É uma honra para mim ser também maranhense”, disse. Então mandou a primeira música da noite. Coincidência ou não era Oração do anjo. Dali em diante desfilou pérolas de todos os seus discos, incluindo um gravado ao vivo, a sair em 2009, só com músicas inéditas. O seu olhar (Arnaldo Antunes e Paulo Tatit), Dindinha (Zeca Baleiro), Cantiga (Zeca Baleiro), Achou! (Dante Ozzetti e Luiz Tatit), Pecadinhos (Zeca Baleiro), São Genésio (Tata Fernandes e Gero Camilo), Boi de haxixe (Zeca Baleiro), Galope rasante (Zé Ramalho), Avesso (Ceumar e Alice Ruiz), as inéditas cujos títulos ainda não sei. Com as participações de Luiz Cláudio e Josias Sobrinho, juntos ou separados, fez várias: Maldito costume (Sinhô), Gírias do Norte (Jacinto Silva e Onildo Almeida), As “perigosa” (Josias Sobrinho), Rosa Maria (Josias Sobrinho), Bacurau Pragueiro (Josias Sobrinho).

Solícita, a cantora cumprimentou a todos os que ainda terminavam de trocar as fichas quando voltou. Autografou discos, posou para fotos com quem quis, avisou-me: “espera que tenho um negócio pra ti lá no camarim”. Se ela havia esquecido o disco de Gero, o que poderia ser? A curiosidade matou o gato, eu que não sou um, sabia que não ia morrer. Pensei, pensei e não consegui matar a charada.

Alguns minutos mais, Ceumar retorna, roupa trocada, e me presenteia com a gravação inédita de seu próximo disco. Só vou adiantar que é um belíssimo ao vivo, todo inédito em sua belíssima voz – Rubi já gravou Oração do anjo, daquele repertório. Mais, escrevo depois, quando o disco for lançado e os poucos-mas-fiéis leitores deste blogue também puderem ouvi-lo.

[*trocadilho com Maravia, música de Dilu Mello e Jairo José gravada por Ceumar em Sempreviva!]